ANÁLISE DA PEC Nº 15/2015, QUE TORNA O FUNDEB PERMANENTE
A Proposta de Emenda à Constituição nº 15, de 2015, de autoria da deputada federal Raquel Muniz (PSD-MG) e outros, e que tem a deputada Dorinha (DEM-TO) como relatora na Comissão Especial designada para debater a matéria, tem por finalidade tornar permanente no texto constitucional o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, entre outros objetivos que relataremos adiante.
O FUNDEB foi instituído com as seguintes finalidades, entre outras:
- Combater as desigualdades socioeconômicas e regionais, uma vez que a vinculação de recursos do art. 212 da CF não se mostrou suficiente para implantar padrão mínimo de qualidade na educação básica do país;
- Ampliar o atendimento de matrículas no nível básico, garantindo o financiamento per capita por meio de Custo Aluno Anual (CAA) definido nacionalmente, através da divisão das receitas do Fundo Contábil pelas matrículas ponderadas para cada etapa e modalidade de ensino de cada uma das unidades da federação (custo mínimo);
- Fortalecer o regime de cooperação entre os entes federados, ampliando a participação da União no financiamento da escola básica, dado que essa esfera administrativa concentra quase 2/3 (dois terços) da arrecadação tributária nacional;
- À luz do item anterior, equilibrar o pacto federativo, visto que os municípios detêm 18% da arrecadação tributária e os estados 25%, porém esses entes são responsáveis por 37% e 32% das matrículas escolares, respectivamente (fonte: Censo Escolar 2015). Sem contar que o CAA na educação infantil, de responsabilidade dos municípios, é o maior entre todos da educação básica;
- Equalizar em patamares internacionais os custos das matrículas na educação superior e básica. No início do Fundeb, o investimento por aluno no ensino superior era 12 (doze) vezes maior que o da educação básica. Em 2014 essa relação ficou perto de 5 (cinco). Na OCDE ela gira em torno de 2,5 (duas vezes e meia).
- Valorizar os profissionais do magistério, através de piso salarial profissional nacional.
Decorridos 10 anos de vigência do FUNDEB, nota-se que o Fundo tem sido importante para assegurar as matriculas obrigatórias nas redes de ensino (da creche ao ensino médio, ampliando significativamente a abrangêbncia do antigo FUNDEF), embora 3,8 milhões de crianças e adolescentes ainda estejam fora da escola e quase 50% das pessoas com 25 anos ou mais de idade sequer concluíram o ensino fundamental. A qualidade da educação é outro ponto sensível sobre o qual o custo aluno mínimo do FUNDEB impõe limitação para avançar nas redes públicas de ensino.
Quanto ao piso do magistério, inserido na Emenda Constitucional 56 (FUNDEB), segundo levantamento do Ministério da Educação, apenas 44% dos municípios brasileiros pagaram a quantia mínima legal aos professores em 2015, tendo a maioria dos estados cumprido o valor ainda que na forma de remuneração e não de vencimento, e em muitos casos descumprindo as progressões dos planos de carreira da categoria, outro princípio constitucional voltado à valorização profissional e à própria qualidade da educação.
O amplo debate sobre a Lei 13.005, que instituiu o Plano Nacional de Educação, demonstrou que além de ser necessário melhorar a gestão educacional, é preciso investir na qualidade da educação também por meio de mais recursos financeiros para o nível básico (até atingir o percentual equivalente a 10% do PIB em 2024). Sob a ótica do financiamento dos salários dos professores, o último estudo da OCDE mostrou que a remuneração média do magistério brasileiro que atua na escola básica corresponde a quase 1/3 (um terço) da média remuneratória dos docentes da OCDE (US$ 31 mil/ano contra US$ 12 mil/ano).
Desafios para o FUNDEB permanente
O fim do Fundeb, por si só, instalaria um colapso na educação pública brasileira, sobretudo com a vigência da Emenda Constitucional nº 95, que suspende a vinculação de receitas da União para a educação e limita drasticamente os gastos sociais em todas as esferas administrativas.
Apenas essa situação já seria suficiente para manter o FUNDEB como política de sustentação do financiamento da educação básica. Porém, há inúmeras mazelas a serem corrigidas no sistema educacional brasileiro, que somente um Fundo solidário, robusto e perene será capaz de cumprir com os objetivos.
A primeira questão refere-se à segurança jurídica. As políticas públicas educacionais são de longo prazo e necessitam de investimentos permanentes. O país precisa incluir estudantes nas escolas e garantir padrão de qualidade para além do mínimo atual, caso contrário não conseguirá garantir bem-estar social tampouco promover o desenvolvimento contínuo, com inclusão e sustentabilidade.
Além de garantir as matrículas obrigatórias, é preciso eliminar o analfabetismo, diminuir a repetência, ampliar a escola integral, garantir a conclusão da educação básica a todos (atualmente só 54% dos jovens concluem o ensino médio aos 19 anos, sendo que na região Norte esse percentual cai para 14,3% e entre os pobres, 22,4% – fonte: Pnad- 2014); assegurar formação, salário e jornada dignos com valorização da carreira de todos os profissionais da educação.
O Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi), previsto na meta 20 do PNE, é política essencial para assegurar os insumos necessários à oferta da educação com qualidade em todas as escolas do país. E o FUNDEB precisa incorporá-lo como mecanismo de definição do investimento per capita anual.
O artigo 206, VIII da CF prevê a regulamentação do piso salarial nacional para todos os profissionais da educação (definidos no art. 61 da LDB), entre professores, especialistas/pedagogos e funcionários da educação. E é através do FUNDEB e do CAQi que se deve pavimentar a regulamentação desse dispositivo constitucional.
O controle dos recursos educacionais, seja na arrecadação ou na gestão, precisa ser aprimorado pela Lei de Responsabilidade Educacional. E esse é o principal objetivo dessa legislação em debate neste momento na Câmara dos Deputados.
Para se garantir os investimentos na educação que dialogam com os objetivos da Constituição e do PNE, a União precisa aportar mais recursos no FUNDEB. E os estados e municípios precisam adotar mecanismos de esforço fiscal, cobrando corretamente seus impostos e distinguindo a capacidade de seus contribuintes.
Propostas para aperfeiçoamento da PEC 15/2015
A CNTE considera importante a iniciativa dos propositores da PEC 15/2015, voltada à instituição permanente do FUNDEB no texto constitucional, porém, diante dos temas acima abordados, propõe à relatora profª. Dorinha as seguintes alterações no projeto original:
* Art. 212-A, III – incluir o inciso VI do art. 208 da CF, que trata do ensino noturno, como referência para a distribuição dos recursos do FUNDEB.
* Art. 212-A, III, “b” – estabelecer o CAQi como mecanismo de cálculo do valor per capita anual.
* Art. 212-A, III, “c” – prever a regulamentação do piso do art. 206, VIII da CF, a fim manter a coerência do texto constitucional.
* Art. 212-A, VI – estabelecer a contribuição mínima da União no percentual de 20%, com vistas a atender ao CAQi.
* Art. 212-A, XI – aumentar o percentual para pagamento de folha de pessoal para 80% no mínimo, para atender ao princípio do piso salarial e da carreira para todos os profissionais da educação.
* Art. 212-A, § 1º – prever os critérios de composição do CAQi.
* Art. 212-A, § 2º – observar 20% no mínimo de contribuição da União sobre o total do Fundo.
Brasília, 28 de março de 2017
Diretoria Executiva